Conversa com o Cangalheiro Numa noite de Velório.

Num príncipio de noite também lá caminhei para velar o defunto que tinha por sinal morrido num desastre de viação já fazia uns dias. estava em Pousadela e por lá vi passar o Cangalheiro com a Urna dentro,  ele vivia ali a uma escassa centena de metros.
Caída a noite e como naquele tempo ainda cá em Nogueira não havia casa mortuária lá fomos para a sua residência, pois naquele tempo para matar o bicho como então se dizia sempre havia uma bebida espirituosa. Era obrigatório no Velório
Lá fomos e por obra do acaso demos no quarto com a referida bebida nada mais nada menos que três garrafas de vinho do Porto. Num Pinga a mim, pinga a ti, num ápice lá demos cabo do respectivo.
Saídos para fora de pé entre pé diz-me o meu Amigo dos Copos olha que o Rios está a tirar-te a medida ao fato. Se calhar vais ser o próximo. Nós os Doentes alcoólicos temos dificuldade de visão ou então vemos o que não deveriamos ver, o certo é que ao olhar para ele deu-me a ideia que assim acontecia, nem era de admirar dado o meu aspecto cadavérico.
Digi-me a ele e disse- lhe Rios, escolhe outro e tens aí muitos mais interessantes e lucrativos, pois o meu é um funeral pobre, já que não vai haver velas a arder, nem Padre, ou missas e a salgadeira será uma terceira.
A brincar respondeu-me que não me preocupasse que iria então escolher outro.
Escolheu ele e escolhi eu, porque passados uns meses deixei de beber e já lá vão uns vinte e cinco anos que esta história conta.
   Se foi  do Rio não sei, mas que foi de trocar a bebida alcoólica pela água isso foi seguramente. Se continuasse a beber mais uns mesitos, lá iria viver para perto dele ( estaria a fazer tijolo, como se diz na gíria).
Eu não queria morrer, mas matava-me diáriamente.
Hoje tudo faço para estar de bem com a vida, procuro ajudar para ser ajudado.